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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

EXAME DA ORDEM OU DA DESORDEM?

EXAME DA ORDEM OU DA DESORDEM?

A Lei 8.906/1994, publicada no DOU em 05 de julho de 1994, revogando a lei 4215/1963, introduziu no ordenamento pátrio, o novo estatuto da advocacia, regulamentando e modernizando a profissão de advogado. A nova Lei veio para readequar a profissão à nova perspectiva constitucional, vez que, a lei anterior havia sido criada na iminência de um regime de exceção. Com a promulgação da constituição de 1988, far-se-ia necessário a readequação da boa parte das Leis vigentes, apesar de que, muitas delas tenham sido absolvidas pelo novo regime constitucional.

No caso do Estatuto da Advocacia, o legislador ordinário, achou por bem reedita-lo, fazendo assim, também, uma readequação dos quadros administrativos e na forma de ingresso, e ainda determinando a criação de um Código de Ética dos advogados, que traça princípios e diretrizes de trabalho para o profissional advogado.

Preteritamente a edição do novo estatuto da advocacia, Lei 8.906/1994, a função de advogado era regulada pela lei 4215/1963, que dispunha no artigo 48 que para se inscrever na ordem, far-se-ia necessário a prática de estágio jurídico ou habilitação no Exame da Ordem, se não vejamos:


Art. 48. Para inscrição no quadro dos advogados é necessário:

I - capacidade civil;
II - diploma de bacharel ou doutor em Direito, formalizado de acordo com a lei (art , 57);
III - certificado de comprovação do exercício e resultado do estágio, ou de habilitação no Exame de Ordem (arts. 18, inciso VIII, letras a e "'b" e 53) ;
IV - título de eleitor e quitação do serviço militar, se for brasileiro:
V - não exercer cargo função ou atividades incompatíveis com a advocacia, (arts. 82 a 86) ;
VI - não ter sido condenado por sentença transitada em julgado em processo criminal, salvo por crime que não importe em incapacidade moral;
VII - não ter conduta, incompatível com o exercício da profissão (art. 110, parágrafo único);
Parágrafo único. Satisfazendo os requisitos deste artigo, o estrangeiro será admitido à inscrição nas mesmas condições estabelecidas para os brasileiros no seu país de origem, devendo exibir diploma reavaliado, quando não formado no Brasil.

(Grifos nossos)

Neste contexto, é possível vislumbrar que existiam dois caminhos que levavam à inscrição, quais sejam: Aprovação em estágio OU Exame da Ordem, este último, forma mais evasiva de avaliação profissional, vez que, impossibilita o profissional de demonstrar com plenitude a sua capacidade intelectual, profissional e persuasiva, esta que é extremamente necessária ao profissional do direito.

É importante ressaltar que, o exame da ordem, na vigência da Lei 4215/1963, far-se-ia necessário, tão somente em casos em que o bacharel não tivesse feito o estagio profissional ou não tenha obtido resultado satisfatório no referido, conforme expõe o artigo 53 da lei aludida:

Art. 53. É obrigatório o Exame de Ordem para admissão no quadro de advogados, aos candidatos que não tenham feito o estágio profissional ou não tenham comprovada satisfatoriamente o seu exercício e resultado (arts. 18, inciso VIII, letras a e b; 48, inciso III, e 50).



§ 1º O Exame de Ordem consistirá, em provas de habilitação profissional, feitas perante comissão composta, de três advogados inscritos há, mais de cinco anos, nomeados pelo Presidente da Seção na, forma e mediante programa regulado era provimento especial do Conselho Federal (art. 18. inciso VIII, letra b) .



§ 2º Serão dispensados do Exame de Ordem os membros da Magistratura e do Ministério Público que tenham exercido as respectivas funções por mais de dois anos, bem como, nas mesmas condições, os professores de Faculdade de Direito oficialmente reconhecidas

(Grifos Nossos)

No ano de 1972, em plena ditadura militar, foi criada a Lei 5842/1972, dispondo que os bacharéis em direito que tivessem realizado estagio de prática forense e organização judiciária no âmbito das faculdades de direito, estariam dispensados do exame da ordem e da comprovação do exercício e resultado de estagio profissional. Tal regulamentação legal, criada no auge do regime de exceção, oriundo da ditadura militar implantada no Brasil, de forma irresponsável ou até mesmo com animus futurista, achando que as instituições de ensino nacionais iriam se preocupar com a qualidade do ensino jurídico no país, deixou a cargo das faculdades o programa de estagio para inscrição na ordem dos advogados do Brasil, o que, findou por acarretar problemas jurídicos e educacionais que até os dias atuais se arrastam.

A posteriori, após o fim da ditadura militar, e promulgação da constituição de 1988, foi editada uma nova lei regulamentadora da profissão de advogado, aprimorando as diretrizes a serem seguidas, todavia, dificultando o acesso aos quadros, prejudicando assim, milhares de pessoas, consumidores e colegas de profissão que deveriam ser defendidos pela classe.

No tocante aos problemas educacionais, não nos cabe comentar a fundo, pois, já são conhecidos por toda a sociedade. Embora exista uma boa intenção do estado em querer ver o aumento no índice de alfabetizados no país. A forma pela qual ocorre o incentivo à educação é no mínimo irresponsável, vez que, a desenfreada abertura de instituições de ensino no país cresceu rapidamente, inversamente proporcional a fiscalização das instituições, que acabam por diplomar acadêmicos não aptos a exercer o mister profissional à que foram talhados.

Quanto aos dissabores jurídicos, estes sim, são focos do presente artigo, vez que, o atual estatuto dos advogados, Lei 8.906/1994, não homenageou princípios magnos basilares do direito brasileiro, tais como isonomia, legalidade, livre associação e livre exercício da profissão, a partir do momento em que foi estabelecido um teste de nível, para selecionar os profissionais que podem ou não exercer a profissão, não oportunizando a TODOS, a igualdade que lhes deveria ser peculiar.

A nosso ver, ofende, ainda, o princípio da separação dos poderes, não que estejamos considerando a Ordem dos Advogados um poder político, mas, a existência do exame da ordem, desprestigia a autonomia do poder executivo, este sim, verdadeiro possuidor da obrigação de avaliar e coagir as instituições de ensino superior nacionais à prestação de bons serviços educacionais. A existência de tal norma (obrigatoriedade do exame da ordem), diferente do que a OAB defende ou enseja, corrobora com a má gestão pública, uma vez que, não exerce seu mister, que é além de defender os interesses da classe advocatícia, defender a sociedade e o direito nacional. No caso em baila, cobrar do estado a sua obrigação, para que faça jus ao seu poder de polícia e exerça rígida fiscalização nas instituições de ensino.

Mas a contra senso, a OAB, utiliza-se da autotutela, instituto esse desprezado do ordenamento pátrio, para selecionar quem está apto ou não a exercer a atividade advocatícia, ceifando assim a inscrição dos candidatos que não atingem o nível exigido pelo examinador.

A afronta à legislação é nítida, pois além de afrontar a própria constituição conforme se pode vislumbrar no artigo 205 da Constituição de 1988, que dispõe que o ensino qualifica para o trabalho, vejamos in verbis:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Nesse sentido também dispõe a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional:


Art. 43. A educação superior tem por finalidade:

I - Omissis
II - formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua;
III ao VII- Omissis

(Grifos Nossos)

De tal sorte, a exigência para que bacharéis em direito sejam submetidos a exame de aferição de capacidade, vai de encontro aos ditames constitucionais, considerando que, as qualificações exigidas pela lei, devem possuir o mesmo intuito que o legislador constituinte referenciou, ou seja, formação, conforme se viu nos artigos supramencionados.

Deve-se ainda, levar em consideração que, o órgão de classe, limita-se a verificar e fiscalizar o exercício da profissão, no caso da Ordem dos Advogados do Brasil, por tratar-se, a advocacia como parte essencial ao funcionamento da justiça, a classe deve também funcionar como fiscalizadora dos ditames legais, e desta forma, não poderia jamais aceitar que a lei que rege o seu próprio exercício torne mais dificultoso o acesso dos bacharéis aos quadros da OAB, por pura omissão do estado, quando, editou a Lei 5842/1972, prejudicando assim o ensino jurídico no país.

É mister daqueles que devem defender a legalidade, exigir das autoridades “competentes” maior rigidez na aplicação do ensino no país, e não, tornar dificultoso a vida de milhares de profissionais que se qualificam e ficam impedidos de exercer a profissão pelo fato dos órgãos institucionais deste país não executarem as tarefas destinadas às suas competências.

Como se o exame da ordem dos advogados já não fosse bastante polêmico, a Lei nº 12.249/2.010 instituiu o exame de suficiência para os profissionais da contabilidade, deixando, assim, de ser privilégio somente dos bacharéis em direito, o exame de nível profissional, agora também os contabilistas estarão inclusos nesse pesar.

EMANUEL ARRUDA